A EMERGÊNCIA TRIÉTICA PLANETÁRIA
Dante Augusto Galeffi Professor associado IV da UFBA, professor permanente dos programas de pós-graduação em educação dgaleffi@uol.com.brResumo
A questão ética tornou-se primacial em todos os setores da vida organizada a ponto de constituir-se como movente gerativo de uma ciência da complexidade que reintroduz o ser humano como operador do conhecimento segundo o seu modo de ser no mundo com outros. A Teoria da Complexidade que vem sendo construída no plano epistemológico tem como primazia articular polilogicamente os vários estratos, níveis e planos constitutivos do complexo humano em sua concretude histórica e em seu contexto cosmológico. A emergência triética pode ser compreendida como decorrente do desenvolvimento pragmático e teorético da ciência moderna. Este fenômeno tem proporcionado o desenvolvimento de uma ética da diversidade e da diferença no plano mundial, projetando a importância da educação humana para o alcance de sua plenitude vivente. Uma triética polilógica nos campos ambiental, social e mental. Triética articulada também como uma noologia.
Palavras-Chave: Ética e Complexidade. Emergência triética. Triética.
Iniciando
A expressão emergência triética planetária nasce de uma compreensão de que o ser humano é formado por sistemas de sistemas, assim como qualquer outro tipo de acoplamento estrutural entre organismos e organizações diversas que compõem o cosmos. A compreensão de que o ser humano se encontra em um mundo formado pela interrelação de diferentes sistemas de sistemas ou formas de matéria-energia antagonistas e, ao mesmo tempo, relacionadas a um todo estrutural comum acêntrico, indistinto e indeterminado, enseja uma concepção triética como reconhecimento da complexidade estrutural do ser humano.
A concepção triética apresentada nesta ocasião advém da Epistemologia da Complexidade relacionada à Teoria dos Sistemas Complexos e encontra a sua justificativa no advento de um plano de compreensão metateórico para orientar o desenvolvimento humano, um metaponto de vista articulador do esforço humano de tomar para si a regência de sua vida ambiental, social e mental no sentido da sustentabilidade ética. A palavra ética ganha um contorno, portanto, polilógico, polissêmico, multirreferencial, transpolítico, transcultural. O seu traço é a comunidade humana em seu modo de ser no mundo em relação ao outro e a si mesmo.
Em que consiste uma emergência – como reconhecê-la? Seguirei o fluxo deste questionamento aberto e imprevisível, sem perder de vista o que já se encontra enunciado em uma compreensão articuladora intuitiva.
- Consideração polilógica da emergência triética planetária
A palavra emergência ganhou relevo na Teoria dos Sistemas Complexos ao designar um fenômeno caracterizado como processo de formação de padrões complexos a partir de múltiplas interações simples. O conceito se aplica a qualquer sistema observável, o que implica necessariamente na presença de um “observador”, compreendendo escalas macroscópicas, microscópicas e mesoscópicas. E todo sistema complexo não encontra seu sentido em princípios últimos, fundamentos substancialistas ou causas primeiras, e sim em movimentos de interação entre organismos associados em ambientes autopoéticos, organismos formados por organismos de organismos; organismos-sistemas feitos de sistemas de sistemas de sistemas. A “emergência” é sempre uma confluência de forças produzindo efeitos consequenciais em determinado meio sistêmico. Caracteriza um quantum de matéria-energia em atualizações de padrões recorrentes coletivamente que podem retroagir sobre as partes modelando seus “comportamentos” individuais segundo as leis do todo.
Sem o conceito de Sistemas Complexos (sistemas de sistemas de sistemas) a “emergência” não teria a valência em destaque. E é evidente como o próprio conceito de “emergência” advém do desenvolvimento da ciência em seu curso historial. A Teoria dos Sistemas Complexos é uma forma de explicação dos fenômenos através de descritores não teológicos e teleológicos, aliás, como todo sistema estritamente científico. Claramente uma forma que não é consensual entre cientistas e epistemólogos. Mas permitiu articulações conceituais que não precisam de nenhuma coincidência com “fatos externos”, mas precisam condizer aos eventos observados e descritos. Portanto, condizência e não mais coincidência é a palavra chave para “emergência”.
Ampliando ainda mais, um sistema é dito complexo quando suas propriedades não são tomadas como uma consequência natural dos seus elementos considerados isoladamente. Em um Sistema Complexo, as propriedades emergentes não podem ser explicadas linearmente, monologicamente. Relações não-lineares entre as partes imprimiram uma de suas máximas: o todo é sempre mais que a soma de partes, e o todo é também sempre menos que as partes na medida em que se torna capaz de inibir propriedades das partes. Este todo é a emergência considerada como acontecimento gerador de uma Unidade Coletiva, que é o Sistema propriamente dito. Conhecer o modo de relação entre as partes de um Sistema é identificar suas propriedades emergentes. Assim, um Sistema Complexo se mostra como um conjunto de partes ou subsistemas que possuem processamentos internos próprios, cujo conjunto modela uma unidade coletiva.
Cada sistema tem suas próprias leis, e tais leis vigoram no campo de sua emergência de modo semelhante ao funcionamento da lei da gravitação universal ou a qualquer outra lei da natureza percebida.
Em um Sistema Complexo as “propriedades emergentes” são as exteriorizações ou padrões reconhecíveis pelo aparato cognitivo de observadores implicados com o fenômeno. Portanto, toda emergência é um fenômeno que pode ser reconhecido cognitivamente pela humanidade por suas propriedades externas. Assim, um comportamento emergente aparece quando um conjunto de entidades simples opera em um ambiente formando padrões complexos coletivamente. Não é possível explicar este fenômeno pela simples análise das partes. E como as interações simples entre as partes aumentam na medida em que as partes são acrescidas é praticamente impossível determinar o número de combinações que determinaram uma emergência, assim como não se pode prever o que novas combinações entre as partes podem gerar coletivamente.
Entretanto, a quantidade de interações-conexões não basta para garantir um comportamento emergente. É preciso também considerar o modo como tais conexões estão organizadas e combinadas. Seja em uma organização hierárquica em que há um controle central ou em uma organização sem controle central, uma emergência pode ser reconhecida por suas propriedades evidentes. Mas é preciso também pressupor o aparato cognitivo intrínseco que possibilita tal fenômeno de reconhecimento.
Deixando de lado o conceito técnico de emergência e configurando o seu sentido eco-sócio-antropológico, pode-se dizer que uma emergência é reconhecida quando afeta a totalidade da vida humana. Deste modo, há em escala mundial três emergências atinentes ao comportamento ético humano: ambiental, social e mental. É evidente como são três planos de um mesmo todo emergente: o desenvolvimento humano mundial e global. Três sistemas de sistemas interagindo dinamicamente, um influenciando o outro e projetando as condições presentes e futuras da vida humana sustentável.
- A complexidade como metaponto de vista articulador da emergência triética planetária: a contribuição de Stéphane Lupasco
Stéphane Lupasco (1900-1988) desenvolveu um pensamento que considero paradigmático para a compreensão da triética humana. Trata-se de uma concepção paradigmática justamente pela sua densidade conceitual articuladora de uma concepção de natureza que parte do reconhecimento de três modalidades de matéria-energia constitutivas também do ser humano em seu modo de ser fatual e histórico.
E digo ainda que o caráter paradigmático do pensamento de Lupasco pode ser reconhecido no grande vigor criador de sua concepção e explicação das três formações de matéria-energia que constituem a totalidade do que se conhece como o Cosmos, a partir inevitavelmente do ponto de vista humano em seu ambiente de vida planetário. Descreverei a seguir a concepção de Lupasco sobre as diferentes matérias-energias que compõem o universo e de como estas estão presentes nas três éticas humanas.
I – A matéria-energia macrofísica ou física dos fenômenos ditos inanimados
Trata-se aqui da matéria física sujeita ao Segundo Princípio da Termodinâmica descoberto no século XIX pela Estatística de Boltzman.
O segundo princípio ou lei da termodinâmica afirma que um sistema, com sua estrutura ou elementos que o compõem, se for fechado ou não puder mais receber energia do exterior, se degrada por si mesmo em energia térmica ou calor, produzindo uma homogeneização progressiva e irreversível. Estamos diante da chamada entropia positiva, o que levou à consideração, no século XIX, de que o universo caminhava para a morte. Uma consideração que levava em conta apenas um tipo de matéria-energia e que logicamente não serve para explicar os outros dois tipos de matéria-energia nem muito menos a dinâmica dos processos existentes na extensão cósmica. De qualquer modo, do ponto de vista macrofísico ocorre um fenômeno homogeneizante progressivo e irreversível, sendo a homogênese o traço dominante desta formação de matéria-energia.
Entretanto, mesmo reconhecendo o principio de homogeneização como a marca da matéria-energia macrofísica, Lupasco observa que isto já pressupõe uma heterogênese de origem, e que esta inevitavelmente antecede qualquer fenômeno em que se observa a entropia positiva. Isto significa a existência de uma função dialética antagonista de base observada em todos os tipos de matéria-energia, também pressupondo as funções de atualização e potencialização.
Na matéria-energia macrofísica ou “inanimada” é possível encontrar um processo dinâmico e antagônico em ação, no qual os tipos de energia (mecânica, elétrica, química etc.) se transformam em energia térmica degradada. O que não ocorre linearmente, mas em ziguezague, indicando que apenas certa quantidade de energia se degrada determinando a quantidade crescente que constitui a entropia progressiva.
II – A matéria-energia biológica ou biofísica, ou física dos fenômenos animados. Tudo aqui se passa aparentemente como o oposto da matéria-energia macrofísica. Trata-se da matéria “viva”. Neste âmbito se assiste a uma atividade energética constituída pelos mesmos elementos atômicos da macrofísica, todos expressos na Tabela de Mendeléjev, mas que engendram outras combinações e arranjos fazendo emergir a complexa e prodigiosa sistematização heterogeneizante dos sistemas vivos em toda a sua vasta extensão. Como alerta Lupasco, não há dúvida de que a partir das propriedades fundamentais da energia (homogeneização, heterogeneização, potencialização e atualização) já estamos em presença de dois tipos de matéria que são sistemas distintos.
Fala-se aqui de sistema porque a energia possui por sua constituição a possibilidade de edificar sistemas. Ou como diz Lupasco “tudo é sistema no seio da energia” (1994, p. 12). Há neste ponto uma preciosa síntese da história do conhecimento físico que leva à ruptura com a lógica clássica, lógica que não admite a presença de dois temas contraditórios. O desenvolvimento conceitual desta ruptura se encontra no célebre postulado de Max Planck expresso em 1900, quando este tentava resolver uma equação em virtude da qual a energia aumentaria até ao infinito sempre que sua frequência fosse elevada. E como a resolução desta equação se verificou impossível, ele formulou a sua teoria dos quanta, na qual um quantum seria uma quantidade discreta que caracteriza a constituição da energia. Trata-se do célebre hf.
O passo seguinte foi dado em 1904 por Einstein, ao descobrir que a luz é feita de fótons, que são os quanta hf de Planck, simultaneamente corpusculares e ondulatórios. A luz, assim, aparece como descontínua, mas ao mesmo tempo obedece às leis da ótica, sendo também uma onda eletromagnética. Estamos na presença de uma contradição fundamental no sistema da luz, do brilho. Alguns anos mais tarde, diz Lupasco, apercebemo-nos, graças ao experimento de Davisson e Germer, que toda a onda é ao mesmo tempo um corpúsculo e todo o corpúsculo uma onda.
A contradição, pois, constitui a própria energia em suas diversas variações, e é justamente tomando a contradição como princípio gerador dos estados de energia que se pode reconhecer a existência de diferentes tipos de matéria-energia, introduzindo a contradição no seio da lógica do sentido em todos os seus níveis de atuação. E na matéria energia biológica ocorre justamente o contrario da entropia progressiva: a neguentropia autopoética (autoprodutiva). O antagonismo entre processos de homogeneização e heterogeneização encontra-se na base da matéria “viva”, com a predominância da função contrária ao que vigora na macrofísica.
III – A matéria-energia microfísica e suas expressões. Aqui nos deparamos com uma tripartição na delimitação da terceira matéria-energia. Tanto ela é a física do átomo, como a física do núcleo atômico e a física do psiquismo. São três físicas dentro da microfísica. Trata-se claramente de reconhecer a terceira matéria como completamente diferenciada das outras duas, porque esta não se constitui do antagonismo da homogeneização e da heterogeneização, e sim de uma relação antagônica de outra ordem, em que nunca se alcança o extremo, mas se gera uma dobra por superposição e por precipitação de estados similares que se anulam instantaneamente.
a) A matéria-energia atômica ou física do átomo
Toda energia é composta por átomos. Todo átomo é formado por um núcleo de eletricidade positiva e por elétrons de eletricidade negativa que giram em volta do núcleo em orbitais diferentes. E os orbitais se mostraram diferentes graças ao postulado de Pauli, para o qual duas partículas idênticas como os elétrons, os prótons e os nêutrons, mas não os fótons, se excluem mútua e reciprocamente do seu próprio estado quântico definido por quatro números quânticos (nlms).
Em síntese, um átomo é um sistema de sistemas, o sistema do núcleo e o sistema do núcleo e dos elétrons. Uma molécula é um sistema de sistemas, pois é composto por átomos, portanto, de sistemas de sistemas, chegando aos objetos que afetam os nossos sentidos, aos planetas, estrelas, galáxias, universos e multiversos. E como observa Lupasco, é notável, entretanto como os fótons não se submetem ao princípio de Pauli, pois podem acumular-se livremente no mesmo estado quântico, ainda que a transformação da energia dos sistemas “materiais” em energia fotônica permita a homogeneização da energia, enquanto na base de sua heterogeneidade se encontra o princípio da exclusão de Pauli. Este princípio, segundo Lupasco, se encontra igualmente na base de toda matéria “viva”.
b) A matéria-energia nuclear ou física do núcleo atômico
No campo microfísico, a matéria do núcleo atômico realiza propriamente a terceira modalidade de matéria-energia. E por que isto? Ora, o núcleo apresenta uma coexistência tão forte dos dinamismos antagônicos contraditórios que é muito difícil quebrar com o seu campo de força. Isto só é possível mediante uma força superior à coesão nuclear, capaz de rompê-la, promovendo o desequilíbrio dessas interações fortes. A expressão “interações fortes” é apropriada para indicar o que se passa no seio do núcleo atômico. Isto apresenta a terceira modalidade de força da matéria-energia, a força nuclear forte intercalada à força nuclear fraca, ao lado da força gravitacional e do eletromagnetismo.
Ora aqui ocorre uma torção conceitual extraordinária, reintroduzindo o antagonismo e a contradição como princípios constitutivos de toda forma de matéria-energia, não sendo possível conceber os diversos e diferentes níveis de matéria-energia em seu dinamismo senão como um fluxo de conexões e desconexões, entre atualizações e potencializações variadas, geradoras do estado T (Terceiro) em suas derivações fortes e fracas (residuais).
c) A matéria neuropsíquica ou física do psiquismo
Para compreender o que se passa com a matéria-energia no estado T é preciso compreender o comportamento da física do psiquismo ou matéria neuropsíquica. Trata-se de um comportamento semelhante àquele da física do núcleo atômico, como pontua Lupasco.
Observou-se como os dinamismos antagônicos em suas transições da potencialização à atualização e vice-versa, alcançam o sistema psíquico ou o núcleo atômico em um estado mediano ou a meio-caminho dos campos antagônicos (homogeneidade e heterogeneidade). Assim, tanto o psiquismo como o núcleo atômico operam com uma espécie de mediana resultante da interrelação conflitual mais acirrada: alcançam estados de semiatualização e de semipotencialização, correspondendo ao estado T de Lupasco – um estado de equilíbrio e de conflito contraditório ampliado ao máximo, alcançando a mais densa energia.
Sabemos hoje como o sistema nervoso central é composto de neurônios, por sua vez compostos de células nervosas contíguas e separadas entre si por um tipo de fenda chamada de sinapse. Na sinapse a célula é prolongada por um cilindraxe (uma rotação cilíndrica do eixo) e por terminações dendríticas. Enquanto as terminações dendríticas estão em contato pela sinapse com os órgãos sensoriais periféricos, as cilindraxes veiculam o influxo nervoso da região pré-simpática para a região pós-simpática do cérebro.
No âmbito da matéria neuropsíquica a dinâmica antagonista gerada pela relação dos sistemas aferente e eferente o sujeito é o centro das atualizações tal como tudo o que se atualiza é o centro do sujeito, é a obra do sujeito. Como centro das atualizações pode-se também dizer que o atualizador é o sujeito, ele é a operação subjetiva, subjetivante. Sem atualização não há sujeito operador, sem sujeito operador não há atualização. No plano neuropsíquico toda atualização “é uma subjetivação, e toda subjetivação enquanto operação nervosa é uma atualização” (LUPASCO, 1994, p. 20).
É preciso também enfatiza como toda atualização subjetivante é inconsciente, apesar de arrastar consigo uma consciência de qualquer coisa, como, por exemplo, a criação mental de um objeto externo, objeto das sensações no estado de potencialidade. Assim, no sistema aferente o sujeito é a atualização e a inconsciência de uma heterogeneidade, assim como o objeto engendrado por ele é a sua potencialização consciente, como também a consciência de uma homogeneidade, consciência da identidade do objeto. Já no sistema eferente os influxos eferentes partem dos centros cerebrais e seguem até às terminações neuromusculares e operações motoras (movimento dos órgãos, das pernas, das mãos, dos olhos etc.).
Procurarei sintetizar as principais linhas de conduta correta/incorreta de cada instância ética, segundo a modelagem conceitual de Lupasco, para daí tratar da emergência triética planetária como tarefa ética para o ser humano contemporâneo.
I – A Ética Macrofísica ou Ética da Energia Homogeneizante
De acordo com Lupasco, a ética macrofísica se impõe em dois planos: o do mundo exterior e aquele de nossa ação sobre ele. Cada ser humano vivente está na presença de objetos exteriores que se apresentam como subsistentes ou dotados de uma permanência. Ninguém poderia viver sem as regularidades subsistentes dos objetos percebidos. Os objetos externos são a referência perceptiva de que haverá sempre um plano de consistência para o desenvolvimento humano em seu fluxo existencial. Trata-se, talvez, da instância primária do habitus como homogeneização do comportamento vital, o que oferece o primeiro plano de identidade do ser humano, pois diariamente percorremos os mesmo caminhos e realizamos as mesmas ações do dia anterior, repetimos as mesmas necessidades vitais, sociais e mentais. E mesmo na suposição de que é sempre possível ocorrer algum fenômeno desagregador desta referência homogênea do mundo exterior, isto será um acontecimento advindo do exterior. Tratar-se-ia, então, de uma supressão de uma permanência pela introdução de uma situação inicialmente caótica, heterogeneizante. Uma não-identidade se sobrepondo a uma identidade anterior ao acontecimento igualmente objetivo no plano macroscópico.
É evidente como tocamos aqui o cerne da homogeneização dos processos de identificação operados pelo sistema neuropsíquico. A potencialização, assim, é a configuração da objetividade como consciência da consciência em subjetivações atualizantes. Faz parte, portanto, do comportamento humano operar na ordem da homogeneização em seus atos psíquicos, em virtude de estados de matéria-energia que estão na base de sua afetividade vivente. Assim, o comportamento homogeneizante imposto pelo mundo macrofísico tem o seu lugar reservado no sistema neuropsíquico.
A nossa biologia depende do plano de homogeneização para manter-se aderente ao acontecimento da heterogeneização contínua que é a própria vidavivente. Tudo o que vive está na passagem contínua da heterogênese à homogênese e vice-versa, com predominância da heterogênese quando tudo de novo recomeça e de novo se autoproduz repetindo-se e variando-se em combinações fora do controle e da previsibilidade. Sem a concretude aparente da macrofísica tudo se reduziria a uma sucessão de instantes cada um anulando o anterior sem manter minimamente qualquer vínculo gerativo de continuidade homogeneizante. A própria existência de sistemas de sistemas, tudo afinal é sistema de sistemas, é um traço da homogeneização sem a qual nada poderia se precipitar no mundo dos acontecimentos formativos atualizantes. Sem formações homogêneas nada poderia ser distinto de nada. Sem gradações e processamentos neuropsíquicos antagônicos e contraditoriais, nenhuma inteligência comum seria possível.
Portanto, no plano da matéria-energia macrofísica a ética consiste justamente no comportamento homogeneizante que introduz o princípio de identidade primária em relação aos objetos externos. E toda interiorização destes objetos por parte dos sujeitos atualizantes parece reproduzir a potencialização dos mesmos como unidades em si. Trata-se já do sistema eferente em sua função de atualização ou precipitação da subjetivação que sempre ocorre marcada pelo princípio de identidade espreitado pelo princípio da diferença.
A ética macrofísica, portanto, não é a única dimensão ética atuante no construto humano e se somente ela funcionasse não seria possível compreender o fenômeno heterogenético que é a própria vida biológica. Não seria possível ultrapassar o horizonte monológico dos totalitarismos de toda espécie no domínio político, assim como o monoteísmo religioso fechado e irredutível ideologicamente. Não seria possível criar novos desenhos ontológicos na saga evolutiva do humano, pois dominaria um determinismo absoluto em relação ao ser-aí.
II – A Ética Biológica ou Ética da Energia Heterogeneizante
Parece contraditório e até mesmo estranho o fato do sistema biológico só ter podido ser investigado em sua diferença em relação ao sistema macrofísico muito recentemente. Até muito pouco tempo atrás se acreditava piamente em um único princípio soberano da natureza. Em sua unidade universal, a natureza seria predominantemente macrofísica. A própria biologia estaria subordinada ao princípio homogeneizante geral. Tudo era visto como ordem e o caos um efeito secundário. Prevalecia o princípio de identidade como lei maior para o ordenamento da dispersão vital. Nesta perspectiva, os fenômenos vitais deveriam estar submetidos à ética macrofísica dominada pelo homogêneo e pela homogênese.
Mas, como a ciência precisa sempre se desembaraçar de seus preconceitos para evoluir, foi preciso suspeitar de que, afinal, as leis macrofísicas não se prestam para explicar os fenômenos bioquímicos, biológicos. O próprio estudo relativo às origens das estruturas e sistemas biológicos encontrou a contradição em seu próprio postulado: se o protoplasma aparecia como a menor partícula dos organismos biológicos e, portanto, como fundamento da ciência biológica, apresentando assim a homogeneidade necessária para se constituir uma ciência rigorosa, ele também apresentava a heterogeneidade ao abarcar toda a espécie de constituintes vitais cada vez mais complexos e diversificados.
Tornou-se, então, inviável procurar explicar os sistemas vivos apenas pelo princípio de homogeneização e de identidade não contraditorial. Foi preciso introduzir a heterogênese e a diferença como princípios igualmente estruturantes dos sistemas vivos. Mas esta operação ainda está em andamento, pois prevalece ainda em muitos setores da ciência a lógica clássica do terceiro termo excluído. Mas, o antagonismo entre o heterogêneo e o homogêneo é o mecanismo geral de toda sistematização biológica e se encontra presente em toda construção de sistemas de sistemas de sistemas. Foi preciso, pois, introduzir a lógica do antagonismo no âmbito das ciências da vida para se alcançar uma nova modulação de compreensão dos fenômenos biológicos, necessariamente antagonista.
Como ser biológico a espécie humana encontra-se atravessada pelo antagonismo e pela contradição permanentes, devendo operar processo de equilibração do antagonismo como condição básica de sua existência fática. A ética biológica ou da matéria-energia heterogeneizante é tão importante quanto à ética macrofísica homogeneizante. Sem a contrapartida da heterogênese a espécie humana não passaria de uma máquina concluída em sua estrutura determinista e fechada a novos arranjos criadores. Ao contrário, vive-se justamente uma luta constante de opostos e contraditórios que, afinal, está na base de qualquer sistemas de sistemas de sistemas.
Sem a ética da matéria-energia heterogeneizante ninguém poderia aprender com o outro e mesmo nem se poderia propriamente aprender nada, pois tudo seria uma repetição do projeto ontológico contido na programação celular. Mas, justamente a vida é o reino da heterogênese e da diversificação exuberante, da multiplicidade gerativa e da perpetuação simultaneamente, em devir e em movimentos de saltos de natureza e de repetição de natureza. A ética da matéria-energia heterogeneizante comanda também a vida ambiental, social e mental do humano em suas derivações históricas.
Contudo, se cabe a todos a aprendizagem da ética da heterogênese como condição para uma existência sustentável, cabe também compreender a dinâmica dialógica da matéria-energia em suas idas e vindas antagonistas. Também neste âmbito há sempre uma “justa medida”, uma mediana que modula a equilibração dos opostos diferentes, produzindo séries de séries de resoluções criadoras. Também o excesso de heterogeneização leva a desequilíbrios muitas vezes fatais. É preciso, pois, ter presente como as duas funções antagônicas se entrelaçam na produção do acontecimento do sentido encarnado, e como é preciso cuidar do equilíbrio para se alcançar uma vida plena de metamorfoses e superações, realizações e aventuras espirituais criadoras e solidárias.
Assim como o excesso da função homogeneizante produz toda espécie de totalitarismo e de monismo negador da diversidade e da diferença, o excesso da função heterogeneizante produz toda espécie de dispersão e de decadência ética, abrindo as portas do individualismo exacerbado e de toda espécie de vandalismo e de cegueira ambiental, social e mental. Mas, para se alcançar o cerne das resoluções conflituais, que implicam na existência da terceira matéria-energia, precisa-se justamente aprender mais do funcionamento neuropsíquico do ser humano, em que se dá o fenômeno mais extraordinário do máximo antagonismo e da máxima potenciação criadora de novas e imprevisíveis formações antagonista do Estado T.
III – A Ética Neuropsíquica ou Ética da Energia Antagonista do Estado T.
A partir da dialógica neuropsíquica tem início a vida interior dos seres humanos assim como todo o seu desenvolvimento mental desde o início da espécie. Aparece a dimensão fundamental do imaginário e a capacidade de meditação, assim como desponta a consciência da consciência e da inconsciência, como também o conhecimento do conhecimento e do desconhecimento. O cérebro humano se torna o operador dos processos de subjetivação e de objetivação que dão origem a todo tipo de valor e de valoração, de identificação e de diferenciação, de conjectura e de efetividade acional.
Foi preciso aprender a tomar distância dos estímulos sensoriais resultantes do conhecimento do mundo mediado pelo sistema neuropsíquico, para o engendramento da abertura para o mundo mental subjetivante, o que demarca também uma conquista na evolução da espécie que desenvolve uma capacidade de antecipação e de previsão relativa de acontecimentos futuros na linha do tempo. A capacidade humana de antecipação é a resultante de um longo processo evolutivo da ética antagonista do estado T.
Entretanto, também esta terceira ética contém os seus perigos próprios. A imaginação e o imaginário são armas temíveis sendo necessário aprender os limites da importante função que ocupam na vida neuropsíquica do ser humano. Aqui também é preciso aprender e continuar aprendendo sempre.
Sabemos dos prodígios da imaginação em todos os momentos da história humana. Toda produção humana intencional é antecedida pela função imaginante da mente, o que permite projetar e planejar acontecimentos futuros. Sem imaginação não existiria nem arte, nem ciência, nem filosofia e nem mística. E são estas expressões da atividade neuropsíquica humana que constituem o acervo espiritual da humanidade em suas peripécias históricas. A história humana nada seria sem o poder da imaginação e da antecipação. E até mesmo a memória, a memorização e a evocação do vivido dependem da função imaginante da mente.
No campo, pois, da matéria-energia neuropsíquica há também um ambiente ecológico próprio, um ambiente feito de conexões neuronais marcadas por informações sequenciais na elaboração dos estados mentais. Assim, segundo a sua própria ecologia ou ética, o mundo mental tem também suas espécies e subespécies de micro-organismos psíquicos, de vírus e de antivírus diversificados, logicamente interligados à história do psiquismo humano em seu processo de desenvolvimento até o presente tempo. O acervo psíquico da espécie humana encontra-se armazenado em seus sistemas de códigos linguísticos em sentido mais amplo, compreendendo-se a linguagem como o meio universal das elaborações mais sofisticadas, como também das mais brutais, do espírito humano.
Temos aqui um precioso instrumento conceitual para a investigação das propriedades e leis da terceira ética. Há tudo a se descobrir e inventar neste campo, pois é muito recente esta maneira complexa de investigar os fenômenos mentais, pelo estudo sistemático de seus sistemas e aparelhos perceptivo e acional. Há muito a fazer para que se constitua uma ciência noológica com a precípua função de investigar todo o espectro da ecologia mental, sem perder de vista suas relações de dependência e diferença em relação às outras éticas ou ecologias.
- A emergência triética planetária
Há aqui uma espécie de “salto de natureza” e não apenas de grau no que diz respeito à orientação ética do ser humano em relação à totalidade de sua vida vivente. Assim, para uma compreensão condizente das três éticas emergentes no âmbito planetário, reafirmo o empenho necessário para que se possa articular tal questão com o projeto de desenvolvimento humano sustentável que se apresenta como possibilidade, a partir da conexão neuropsíquica de todos os tipos de matéria-energia. Deste modo, todos nós estamos sendo convidados para a efetivação de um plano epistemológico polilogicamente articulador e articulado que nos permita uma orientação ética capaz de também criar e não apenas de ver e de simplesmente compreender os acontecimentos. Trata-se condizentemente de aprendermos a operar com o conhecimento do conhecimento e do desconhecimento, atualizando e potencializando a consciência da consciência e da inconsciência a serviço do pleno desenvolvimento humano sustentável.
Considerando, pois, que o ser humano precisa agir eticamente em três sentidos distintos e complementares, no ambiental, no social e no mental (sede das subjetivações), temos as seguintes considerações sempre parciais.
- A ética ambiental e sua emergência planetária
De início, é possível esclarecer a proximidade semântica das palavras ética e ecologia, sobretudo porque “ecologia” tem o seu sentido mais geral ligado ao estudo das relações entre seres vivos e o ambiente em que vivem, desde o momento em que o cientista alemão Ernst Haecckel usou pela primeira vez o termo em 1869. As duas palavras de origem grega remetem ao âmbito do “habitar”: oikos e êthos. Se oikos significa “casa”, “habitação”, “bens”, “família”; êthos significa “morada habitual”, “maneira de ser”, “uso”, “costume”. A relação dos étimos é evidente.
Ética e ecologia, entretanto, aparecem comumente como campos distintos da investigação científica. Porém, o século XX viu nascer uma concepção de ecologia que acabou atravessando a totalidade do âmbito vital, incluindo aí a ecologia social e a ecologia mental. Aqui a noção de “ambiente” é fundamental, pois não só existe o ambiente físico, mas também o biológico, o atômico e o neuropsíquico. Neste sentido, o termo “ecologia” vem sendo usado em uma compreensão mais complexa dos diversos sistemas de sistemas em seus comportamentos autopoéticos (autoprodutivos), segundo emergências específicas, incluindo aí o ser humano e suas disposições éticas atinentes ao seu pleno viver e morrer.
Um bom exemplo do uso transversal do termo “ecologia” se encontra na obra de Félix Guattari (2009), As três ecologias, que se tornou uma referência imprescindível para a construção de uma articulação ético-política, chamada por ele de ecosofia, capaz de operar três distintos registros ecológicos em benefício do pleno e criador desenvolvimento humano planetário: o do meio ambiente, o das relações sociais e o da subjetividade humana. Trata-se de se pôr um problema que emergiu do processo civilizatório das sociedades modernas, atrelado ao modo de produção capitalista e que se mostra cada vez mais inadiável, dizendo respeito ao conjunto do mundo.
Nosso planeta tem uma idade estimada de 4,6 bilhões de anos e a vida teria começado há aproximadamente 3,6 bilhões de anos atrás. O gênero homo apareceu entre 4 a 1 milhão de anos. O Homo sapiens surgido entre 400 a100 mil anos atrás atingiu o comportamento moderno somente há cerca de 50 mil anos. As primeiras civilizações datam de aproximadamente 4.500 anos a. C. O processo de crescimento acelerado que culmina com a presente situação ambiental planetária, tem início nos últimos 400 anos de nossa era. É, entretanto, claro como o comportamento inconsciente de devastação do ambiente vital por parte do ser humano o acompanha desde origens muito remotas, não sendo um traço exclusivo do comportamento moderno. Mas o poder de destruição dos ecossistemas múltiplos do planeta só alcançou o atual estágio com o advento da revolução industrial no século XVIII, e não parou de caminhar para a fatalidade que agora se mostra evidente.
Como se sabe a espécie humana tem uma capacidade ímpar para suportar as condições mais adversas de vida, adaptando-se às mais extremas situações de existência. Mas, tudo tem limites. É impossível viver sem oxigênio, água e o mínimo exigido para a manutenção da vida biológica, apesar de alguns viajantes humanos afirmarem que seria possível sobreviver apenas de luz, o que no mínimo pressupõe uma verdadeira revolução molecular, coisa ainda fora das condições da humanidade atual.
Será que ainda há tempo para reverter a situação de desequilíbrio ambiental reinante, ou estamos todos fadados ao desaparecimento como espécie?
A emergência ética ambiental só poderá ser revertida caso haja uma decisão planetária pela preservação das condições mínimas para a sobrevida da maioria das espécies e dos sistemas ecológicos componentes da biosfera. Trata-se de uma ética que deve primar pelo princípio da heterogênese própria da matéria-energia biológica, mas que exige também certo grau de homogênese para poder alcançar equilíbrios vitais renováveis.
Portanto, no âmbito da ética ambiental todos têm o dever de cuidar das condições de equilibração da biosfera planetária, sem os radicalismos que mobilizam grupos de ambientalistas, pois não se trata de somente preservar, mas, sobretudo, de equilibrar os desequilíbrios dentro dos limites vitais da renovação sustentável. Seria impossível só conservar os ambientes vitais, pois isto comprometeria a subsistência humana, que necessita dos meios renováveis para seguir vivendo em equilíbrio renovável garantido.
II – A ética social e sua emergência planetária
Há uma emergência social planetária ainda mais complexa em curso: a superpopulação nitidamente fora de controle. Para onde caminha o processo de desenvolvimento humano? Qual futuro se apresenta para a maior parte da população humana do planeta? Quantos merecerão a suposta salvação na arca do Noé cibernético?
Desde o início do curso histórico com o surgimento das primeiras civilizações o ser humano não parou de experimentar a barbárie e a irracionalidade mais crassa e destrutiva. É preciso, então, corrigir a noção de bondade da natureza humana e de sapiência como única direção do processo de desenvolvimento espiritual. Como afirma Edgar Morin (2005), Bem e Mal são complementares no comportamento humano, sendo necessário acrescentar um segundo qualificativo para a definição da espécie: além de sapiens também demens. Apesar desta dicotomia, há um sentido de resistência à crueldade do mundo que se deve preservar para o sentido ético maior.
A resistência ética em relação ao estado de barbárie reinante nos dois registros éticos é o caminho para a sustentabilidade humana que pode e deve ser alcançada também no plano mental.
III – A ética mental e sua emergência planetária
Apesar da matéria-energia neuropsíquica humana possuir a propriedade mediadora entre as duas forças antagonistas básicas da homogeneização e da heterogeneização a evolução mental da espécie está apenas no seu alvorecer. Os desequilíbrios ambientais e sociais que tanto preocupam os mais atentos em relação ao futuro de nossa espécie se encontram potencializados ao máximo no plano mental. Há tudo a aprender do funcionamento da mente e sua interrelação com a totalidade vivente. Uma mente sempre lúcida e vital só pode existir renascendo a cada instante das cinzas da desordem e resistindo aos imperativos da alienação tendencial para a dispersão e violência entrópica persistente. É preciso aprender a lidar com os antagonismos constitutivos da matéria-energia em suas formações primordiais para que se possa gerar um ser humano definido por sua heterogênese radical, na abertura para a sua plena realização espiritual no contexto de sua finitude e inacabamento ontológico. Pois a evolução da mente humana não pode perder de vista a dinâmica evolutiva que não deve nunca alcançar uma êxtase final, caso se compreenda que o sentido do existir complexo do ser humano é sempre ultrapassar-se sem fim.
Nestes termos, a crise ética de nosso tempo é simultaneamente crise da religação indivíduo/sociedade/espécie. Por isto, é preciso refundar a ética, regenerar as suas fontes de responsabilidade e solidariedade com a totalidade vivente do planeta. E a regeneração pode sempre partir de motivações diversas, como uma fé intensa no poder criador da energia vital, de uma profunda crise existencial, de um dilacerante sofrimento físico ou mental, de um amor intenso assim como da própria percepção da dilaceração ética que assola a humanidade em todas as partes da Terra.
A ideia de sabedoria reduzida à concepção de uma razão sempre clara e segura de si deve comportar a consciência de uma contradição. Pois uma vida puramente racional seria uma produção de pura homogeneização ética, o que não é compatível com a condição humana efetiva e afetiva. A eliminação do não-racional, afinal, seria uma demência e um risco favorecedor de modelos de controle que eliminariam os processos criativos de subjetivação e as singularidades que tornam a experiência humana tão rica e tão potente para o amor incondicional.
- Sem limites, sem fim…
Como, então, caminhar para a realização plena da triética que perpassa a constituição humana em toda a sua complexidade? Estamos diante de um desafio que requer além de uma revolução tecnológica também uma revolução molar e molecular no seio da própria existência fática dos humanos. Uma revolução longa que não pode ser feita por decretos imperiais de grupos humanos pretensamente superiores e aptos a comandar o destino humano global, mas tem que consistir através de atos e correlatos que atendam ao maximamente elevado da potência criadora do espírito sensível e extremamente frágil da instabilidade evolutiva para um amor aos fatos.
Como espécie dotada de inteligência e sensibilidade criadora heterogenética e homogenética simultaneamente não é mais possível deixar de lado o que se mostra imperativo para se conceber o bem viver e o bem morrer da vida do indivíduo-sociedade-espécie. Pois os que percebem a emergência triética como imperativo categórico de toda orientação humana para o seu desenvolvimento mais pleno e aberto, não podem cruzar os braços e deixar de denunciar e de apontar os males produzidos por indivíduos e organizações hegemônicas. Não nos cabe cruzar os braços, mas lutar por uma vida digna e criadora, aberta na deriva do tempo cósmico ainda longo e na superação dos empecilhos negadores da máxima potência do amor incondicional por aprender sempre mais a ser sempre mais, na liberdade da partilha e da solidariedade planetária voltadas para os desafios da complexidade, descortinados pelo conhecimento triético.
Referências
GUATTARI, Félix. As três ecologias. Tradução de Maria Cristina F. Bittencourt. 20 ed. São Paulo: Papirus, 2009.
LUPASCO, Stéphane. O Homem e suas Três Éticas. Tradução de Armando Pereira da Silva. Lisboa: Instituto Piaget, 1994.
MORIN, Edgar. O Método. 6. Ética. Tradução de Juremir Machado da Silva. 2ª ed. Porto Alegre: Sulina, 2005.
NICOLESCU, Basarab. O Manifesto da Transdisciplinaridade. Tradução de Lúcia Pereira de Souza. São Paulo: TRIOM, 1999.
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This article was published on 5th June: World Environmental Day, in Global Education Magazine.